- 25/11/2025
Há exatamente dois meses, a membrana amniótica passava a compor a Política Nacional de Doação e Transplantes criada pelo Ministério da Saúde. A autorização e incorporação ao Sistema Único de Saúde já haviam sido conquistadas em junho deste ano e celebradas por quem lutou e esperou por mais de 10 anos para que o uso do tecido fosse regulamentado para ajudar no tratamento de vítimas de queimaduras.
Segundo Eduardo Chem, coordenador do Banco de Tecidos da Santa Casa de Porto Alegre, a unidade foi responsável por fazer a primeira captação e o primeiro transplante de membrana amniótica do Brasil desde a incorporação no SUS.
A primeira captação ocorreu em 7 de outubro e, desde então, já contabilizam 15 captações e oito envios para unidades de transplante. “É mais fácil conseguir a doação da membrana, em que lidamos com a família em um período de vida, do que com a pele, em que falamos em período de perda, de morte”, ressalta Eduardo Chem.
Ele conta que o primeiro transplante foi feito em uma criança de 9 anos, com queimadura na região temporal, ainda na primeira quinzena de outubro.
Entre as beneficiadas está uma menina de 9 anos que se queimou em um acidente doméstico com líquido quente, em setembro do ano passado. Ela teve 15% do corpo queimado, de 3º e 2º graus, e precisou ficar dois meses internada.
Segundo a mãe, a professora e pesquisadora Maria Cláudia Dal'Igna, a paciente já passou por cinco cirurgias, fez dois enxertos com pele retirada de região doadora do próprio corpo e uma cirurgia usando a membrana amniótica.
“A membrana amniótica foi usada para tratar uma ferida crônica, decorrente das queimaduras, que abre e fecha na cabeça há 12 meses. Seu uso foi muito importante para evitar que minha filha precise realizar mais um enxerto. A recuperação da região doadora é muito desafiadora em razão da dor e dos riscos de contaminação. A membrana acelerou a cicatrização de parte do tecido”, conta.
Para ela, a aprovação do uso da membrana é mais um passo importante para o atendimento qualificado de crianças e adultos queimados. “Eu defendo, pelas experiências com os tratamentos da minha filha e pelos diálogos com a equipe especializada, que a membrana amniótica é curativo biológico, mas também é a celebração da vida, uma forma de honrar a vida em suas múltiplas dimensões: biológica, espiritual, profissional e acadêmica”, destaca.
O Rio Grande do Sul é o primeiro estado a contar com um fluxo estruturado e regular para indicação, coleta, processamento e utilização da membrana amniótica. O Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre também realizou o procedimento recentemente, em uma criança de 1 ano de idade que se queimou com óleo quente.
Doação e uso
A membrana amniótica – usada pela primeira vez no Brasil, de forma emergencial, no tratamento de queimados da tragédia da Boate Kiss (RS), em 2013 - acelera a cicatrização das lesões e possibilita a redução de infecções e dores.
Ela poderá ser usada em queimaduras de 2º e 3º graus, no caso de síndrome de Stevens-Johnson; em necrólise epidérmica tóxica e em áreas doadoras de enxerto de pele em decorrência de queimaduras. Para outras finalidades, poderá ocorrer em caráter excepcional, se demandada por médico com experiência no uso do tecido, e se autorizadas pela CGSNT.
No tratamento de queimaduras, a membrana amniótica cria uma barreira protetora contra bactérias e outros agentes infecciosos, reduzindo a incidência de cicatrizes hipertróficas e queloides.
A membrana amniótica é um tecido coletado durante o parto, a partir do consentimento das doadoras. Todas as regras para doação e captação constam na Portaria Nº 8.244, de 25 de setembro de 2025
Linha do tempo
O Conselho Federal de Medicina (CFM) autorizou o uso da membrana amniótica em 2021, mas a aprovação para o uso no SUS foi dada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) apenas em 2025.
Entre diversas entidades e profissionais que atuaram para acelerar essa aprovação, a Sociedade Brasileira de Queimaduras fez parte da Frente Nacional pela Aprovação do Uso da Membrana Amniótica em queimados, criada no ano passado.
A membrana amniótica já é usada nos Estados Unidos, União Europeia e em outros países da América do Sul.