- 08/02/2017
O banco de pele Dr. Roberto Corrêa Chem, da Santa Casa de Misericórdia, Porto Alegre, inaugurado em 2005, beneficiou, até o final de 2016, mais de 220 vítimas de queimaduras graves em todo o Brasil. Conforme explica o cirurgião plástico Dr. Eduardo Chem, os Bancos de Pele têm a função de captar, processar, preservar e disponibilizar finas lâminas de pele alógena humana para os Centros de Tratamento de Queimados e politraumatizados do país.
A pele alógena funciona como curativo biológico temporário para cobertura de lesões cutâneas superficiais e profundas, protegendo o leito da ferida contra perdas de líquido e de calor, infecções bacterianas, além de reduzir a dor e estimular a cicatrização. “Sua principal indicação clínica é para os casos em que uma extensa área de superfície corporal está comprometida, inviabilizando a realização do autoenxerto”, ressalta.
BANCO DE PELE
As reservas de tecidos são abastecidas por meio de doações de pele. Caso a família do indivíduo diagnosticado com morte encefálica ou parada cardiorrespiratória apresente o desejo de doar os órgãos e tecido do ente, assina-se um termo de consentimento para a doação. “Todos os protocolos realizados no Banco de Pele, respaldados pela legislação vigente, são executados com base em um rigoroso controle de qualidade”, aponta. Atualmente, os índices de captação e envio de pele são correlatos, conforme mostra o gráfico abaixo.
O especialista relata que a captação de pele consiste em retirar, com o auxílio de um dermátomo ou faca de enxerto, finas lâminas de tecido cutâneo, com espessuras que variam de 0,8 a 1,0 mm. Neste processo, retira-se a epiderme e até uma pequena parte da derme, que constituem as camadas mais superficiais da pele. De modo a preservar a imagem do corpo do doador durante a velação, a pele é, preferencialmente, retirada de regiões acobertadas, como coxas, pernas e tronco posterior.
Após a retirada da pele, as regiões doadoras apresentam uma coloração mais clara em relação ao tom da pele do doador, entretanto, não há sangramento tampouco mutilação destas áreas do corpo.
Ademais, ao final do processo de captação, as áreas nas quais a pele foi retirada são reconstituídas com apósitos, ataduras e esparadrapos. “Este procedimento minimiza possíveis perdas de líquido em virtude da remoção de parte do tecido de barreira do corpo”, pontua.
Todo o processo de captação da pele deve, obrigatoriamente, ser realizado em sala de centro cirúrgico, de modo a preservar as condições do tecido e minimizar possíveis contaminações microbianas. “O protocolo de retirada de pele é muito similar ao de uma cirurgia in vivo. Exige salas higienizadas, degermação de mãos e antebraços, uso de paramentos cirúrgicos e materiais estéreis”, compara.
ACESSO AO MATERIAL
A distribuição do tecido é feita para as Unidades de Tratamento de Queimados de todo o País, sendo regulada pela Central Nacional de Transplantes (CNT) e pelas Centrais de Notificação, Capacitação e Distribuição de Órgãos de cada Estado (CNCDO). O médico transplantador que necessitar de tecido deve entrar em contato com a CNCDO Regional e verificar a disponibilidade de estoque de acordo que atenda a sua necessidade.
Após a verificação de disponibilidade, deve-se encaminhar para a CNCDO um formulário com os dados do paciente a ser transplantado, a quantidade de tecido requerida e os dados do hospital em que será realizado o transplante. “Tanto o médico como o hospital de transplante deverão ser cadastrados no Sistema Nacional de Transplantes (SNT)”, orienta.
A CNCDO é responsável por fazer a intermediação entre o hospital solicitante e o banco de tecidos, que emite a autorização para realização do transplante. “O Banco de Tecidos separa, a partir do estoque de tecido liberado, a quantidade de pele solicitada e organiza o seu envio para o local do transplante. O transporte pode ser feito por via terrestre ou aérea de acordo com a distância do Centro de Transplante”. Em caso de envio aéreo, a CNT solicita à companhia aérea a realização do transporte de forma gratuita.
Além do tecido, são enviadas instruções para manuseio e uso da pele alógena, bem como documentos contendo o registro do tecido enviado, um “Termo de Consentimento” para realização do transplante, que deverá ser assinado por um responsável previamente ao transplante, uma “Notificação de Transplante Realizado” e um “Termo de Notificação de Efeitos Colaterais”. Todos os documentos devidamente preenchidos pelo médico transplantador devem retornar ao Banco de Tecidos para controle de rastreabilidade do procedimento e posterior arquivamento. A região Sudeste é uma das que mais utilizou peles do banco de tecido, conforme mostra a imagem abaixo.
QUANDO USAR?
As principais indicações clínicas para a utilização de pele alógena são queimaduras profundas e extensas e grandes defeitos cutâneos provocados por trauma. Um dos fatores mais críticos no manejo e reparo de lesões em pacientes com grandes perdas cutâneas é a adequada cobertura da área lesada de modo a evitar maiores perdas volêmicas e infecções bacterianas oportunistas. O tratamento cirúrgico padrão-ouro nestes casos é o enxerto de pele autóloga.
No entanto, a intervenção cirúrgica se limita quando grandes extensões de pele foram acometidas pela queimadura, ou grandes áreas foram lesadas por traumas físicos e, ainda, pela restrição de sítios doadores de pele do próprio paciente. “Nestes casos, a utilização de aloenxerto é um tratamento providencial e pode representar a diferença entre a vida e a morte desses pacientes, havendo redução da mortalidade de grandes queimados quando se dispõe dessa alternativa”.
Assim, o especialista comenta que em observações da evolução clínica de pacientes com queimaduras de espessura total permitiu-se concluir que, quanto mais precocemente for realizada a retirada dos tecidos necrosados e enxertia de tecido saudável, melhor poderá ser a recuperação da queimadura.