A deficiência está nos olhos de quem vê

YD Comunicação - 14/03/2023

Coleta sofreu queimaduras ainda criança e, apesar das sequelas, vive normalmente e feliz

"A sociedade cria a exclusão. No meio em que vivo, nos meus 68 anos, nunca tive problema. Cresci, namorei, tive filhoS, cuido dos netos, costuro, pinto, toco violão, faço teatro, sou realizada e consigo tudo que quero". O depoimento é de uma mulher forte, que aos 4 anos de idade sofreu queimaduras por todo o corpo, foi dada como morta, perdeu os dedos da mão direita, precisou ficar dias trancada num quarto escuro para se curar das bolhas nos olhos, mas que não se deixou abater pelas marcas resultantes de um acidente com palito de fósforo. O nome dela é Coleta Maria Ribeiro Lutkenhaus, moradora de Minas Gerais, e escolhida pela Sociedade Brasileira de Queimaduras para homenagear todas as mulheres neste mês de março.

 
O acidente de Coleta aconteceu em 6 de junho de 1954, coincidentemente, o Dia Nacional de Luta contra Queimaduras. A forma como ocorreu serve de alerta para muitos pais. "Estava brincando no quintal enquanto mamãe nos preparava para irmos à missa. Peguei uma caixa de fósforo no lixo e tinha apenas um palito. Risquei e caiu na minha roupa, pegando fogo. Morávamos em uma pensão com 48 quartos em um corredor em L. Saí correndo por ele com o corpo em chamas e tentava apagar com a mão direita. Mamãe me reconheceu e me envolveu com um lençol e apagou o fogo", relembra, com detalhes.
 
O médico que a atendeu deixou um atestado de óbito em razão de tantas feridas. "Chegaram a me colocar numa mesa com flores. Mas mamãe percebeu que eu estava respirando", conta. O tratamento foi feito em casa, com remédios caseiros e a ajuda de um médico. Foram dois anos e quatro meses trancada em um quarto escuro para tratar bolhas nos olhos. "Hoje eu enxergo muito bem, graças a Deus. Fiquei com marcas no corpo, perdi os dedos das mãos, mas fui bem cuidada pela minha família, consegui estudar, trabalhar", detalha ela, deixando claro nas entrelinhas que a mãe também foi outro exemplo de mulher, permitindo que Coleta enxergasse a vida de forma natural, independentemente das marcas. "Lembro que um dia estava bem quente e eu estava de blusa de frio. Mamãe disse para eu tirar que eu era linda assim como eu era", fala, com carinho.
 
Coleta não deixou as queimaduras impor limites a ela. "O médico disse que eu não poderia engravidar porque eu tinha muita retração na pele. Mas namorei, casei e engravidei. O médico quase enlouqueceu, mas pediu que eu não engordasse. Deu tudo certo", relata ela que é mãe de três. Outro episódio que ela lembra remete aos tempos de escola. "Por eu ter perdido os dedos da mão direita, a professora queria que eu escrevesse com a mão esquerda. Desenvolvi a habilidade de escrever com as duas mãos, porque em casa eu usava a mão direita e na escola, a esquerda", diz.

Atualmente, Coleta usa sua história, somada à arte, para ajudar outras pessoas com queimaduras e, também, para prevenção. "O tratamento é profundo. Procuro ajudar as pessoas porque sei que quem está iniciando essa caminhada não é fácil. Quando vejo alguém com muitas queimaduras, penso 'meu Deus, até essa alma se curar, até ela entender'. A sociedade é base, a família é base", frisa. E completa: "faço teatro, subo no palco, não tenho vergonha da minha mão, do meu corpo. Eu me orgulho de ser uma pessoa inteira e essas queimaduras não me fazem uma pessoa diferente. Mas sempre me pergunto como as pessoas me veem", finaliza.

TEATRO -  Coleta é uma dos cerca de 50 idosos que fazem parte do grupo de teatro Sementes, do Centro de Referência da Pessoa Idosa, pertencente à prefeitura de Belo Horizonte e comandando pela diretora de teatro Beth Haas. O grupo é composto por pessoas de 60 a 100 anos de idade. Eles fazem apresentações em escolas, centros de referência de longa permanência e, também, em praças públicas.
 
"Sempre que fazemos um trabalho, escolhemos uma temática e fazemos cenas curtas. Às vezes não se sabe como comunicar algo e o teatro facilita essa comunicação. Através da arte podemos solucionar algumas questões", observa Beth. Foi assim que montaram cenas sobre queimaduras, para o assunto chegar mais leve à toda a sociedade. Falaram sobre cabo da panela fora do fogão, ferro elétrico ligado. "Fizemos cenas mostrando o ato e as consequências dele. A apresentação ocorreu no Parque Municipal, um espaço aberto e foi sucesso de público e de crítica", ressalta Haas.
Para ela, incluir os idosos em ações como essa os empodera. "Eles se sentem importantes por estarem ajudando outras pessoas em assuntos tão necessários", conclui.

Para Coleta, participar do teatro é ajudar na prevenção. "O teatro é uma arte que atrai olhares, compreensões, desperta na pessoa não somente o ver, mas o ouvir tamém e isso leva a mensagem para dentro do ser humano. Quando ouvimos e vemos uma apresentação, aquilo nos marca", destaca. 

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