Pele de tilápia liofilizada deverá ser comercializada em breve após 10 anos de pesquisa

- 17/01/2025

Dr. Edmar Maciel Lima Júnior é coordenador da pesquisa há 10 anos


Após 10 anos de pesquisa, a pele de tilápia poderá ser comercializada em breve para o uso no tratamento de queimaduras e de úlceras, em cirurgias de reconstrução vaginal, na redesignação sexual e na veterinária. Isso porque a Universidade Federal do Ceará (UFC) acaba de publicar um edital de chamada pública para empresas interessadas em obter a pele liofilizada para preparo de curativos voltados ao tratamento de lesões no Brasil e no exterior.  

O produto é uma solução inovadora que melhora substancialmente a qualidade de vida dos pacientes, além de diminuir a carga de trabalho da equipe médica durante o tratamento de queimaduras e feridas. O biomaterial também originou novos métodos cirúrgicos que reduzem a morbidade pós-operatória, os custos cirúrgicos e a necessidade de autoenxertos.

Para falar sobre o assunto, a Sociedade Brasileira de Queimaduras conversou com o coordenador-geral da pesquisa, inventor e detentor de quase metade da patente do biomaterial, o médico Edmar Maciel Lima Júnior. 

 

SBQ – Como foi que tudo começou? 

A pesquisa iniciou-se em 10 de fevereiro de 2015. Esse produto que foi feita a chamada pública chama-se pele liofilizada. Ela é uma pele desidratada, embalada a vácuo e radioesterilizada no Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares (IPEN), em São Paulo, para depois estar pronta para uso em pacientes. 

A ideia da pele liofilizada nasceu nos pesquisadores da UFC em 2018, foi desenvolvida a parte laboratorial na universidade, testada em animais no biotério da Universidade e usada clinicamente em testes em pacientes queimados no Hospital Público Instituto José Frota em Fortaleza (CE). Ou seja, ela é uma pele totalmente concebida no Ceará.

 

SBQ – O que muda com essa chamada pública? 

Essa pele liofilizada foi para uma chamada pública porque envolve a universidade. É uma concorrência em que várias empresas se credenciam e escolhemos a melhor de acordo com o edital. Até junho será escolhida a empresa vencedora. Após essa chamada pública, a empresa registra esse produto na Anvisa. Concomitante a isso, desenvolve a sua fábrica para que aí sim essa pele liofilizada possa ser comercializada no Brasil e no exterior. 

No momento, essa pele é utilizada apenas em pesquisas, tanto no Brasil como no exterior. Nós produzimos a pele aqui na Universidade e enviamos para projetos de pesquisa.

No produto Pele Liofilizada a Universidade Federal do Ceará detém 50% da titularidade, Edmar Maciel 43% e  Marcelo Borges tem 7%. 



SBQ – Quais as vantagens da pele liofilizada? 

A vantagem dela sobre o que é feito atualmente na maioria da rede pública, que são curativos com cremes e pomadas, é que nas queimaduras superficiais ela fica aderida até o fim do tratamento e nas queimaduras mais profundas é trocada a cada cinco ou seis dias e não diariamente. 

E a vantagem dessa pele liofilizada sobre o primeiro produto desenvolvido, que é a pele no glicerol (que ainda não foi para chamada pública) é que o custo de transporte é reduzido em até 90% no transporte aéreo, por ela poder ficar em temperatura ambiente, diferente da glicerolada, que tem que ficar em geladeira, 

Além disso, por ser uma pele desidratada e embalada a vácuo, ela não tem umidade e reduz o risco de contaminação bacteriana. E por essa pele liofilizada não conter glicerol, ela não tem que ser lavada exaustivamente três vezes antes de aplicar no paciente para remover o glicerol, que é um álcool e causa dor.


SBQ – Após todos os trâmites da chamada pública, a pele poderá ser comercializada? 

Os pacientes que já utilizaram pele de tilápia liofilizada em queimaduras, hoje são mais de 700 pacientes, estão em serviços onde é feito um projeto de pesquisa e esses pacientes entram em projeto de pesquisa. Somente depois que a empresa vencedora do chamamento registrar na Anvisa é que ela vai ser comercializada e disponibilizada tanto no Brasil como no exterior para hospitais e também para a população.


SBQ – Ela pode ser usada somente para tratamento de queimaduras? 

Além de ser sucesso em queimaduras, tornou-se sucesso em feridas em animais, na odontologia, em feridas em cavidade bucal, na ginecologia, na reconstrução de canal vaginal, na agenesia vaginal, também em mulheres que fizeram irradiação e tiveram câncer e com isso a vagina encurtada, então foi sucesso na reconstrução de vagina. 

E um projeto que nós temos em Cali, na Colômbia, com mais de 200 pacientes operados, de redesignação (mudança de sexo de homem para mulher). Também foi sucesso numa síndrome em crianças que nascem com os dedos das mãos juntos, que se chama sindactilia, e também está sendo estudado em outras áreas, como, por exemplo, feridas e úlcera varicosa.


SBQ – Para o paciente, quais são as vantagens dessa pele? Ela reduz a dor? Reduz o tempo de tratamento? Pode falar um pouco sobre isso?


A vantagem da pele liofilizada é que ela diminui as trocas de curativo, reduzindo drasticamente a dor nos pacientes. Além disso, como diminui a troca de curativos, diminui o trabalho da equipe e, consequentemente, diminui os custos do tratamento. Existe uma redução de um a dois dias no tempo de internação.

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