YD Comunicação - 05/05/2022
Com cicatrizes na pele, muitas vezes na barriga, mães tiveram medo do que poderia acontecer na gestação. Especialista esclarece o processo de gestar após um acidente com queimaduras
A gravidez é um momento único na vida de uma mulher. São nove meses de conexão entre mãe e bebê. Mas, e quando a mãe tem marcas na pele que podem atrapalhar o desenvolvimento da criança? Estima-se uma incidência de 3% a 7% de gestantes vítimas de queimaduras em países em desenvolvimento. A Sociedade Brasileira de Queimaduras (SBQ) ouviu mães que contam sobre o processo de gestar após as queimaduras.
A mistura do álcool e fogo foi a causa do acidente da recepcionista e influencer digital Jeniffer de Oliveira. Na tentativa de queimar o lixo, o álcool explodiu e queimou a pele dela, que teve 48% do corpo queimado, entre rosto, braços e barriga.
“A gestação foi tranquila, graças a Deus, tive muito medo e receio pois estava com dois expansores de pele nas costas”, conta ela, que além do acompanhamento com o obstetra, teve atendimento com o cirurgião plástico para esvaziar os expansores de pele no início da gestação.
Devido à depressão pós-parto após do primeiro filho, Morganna Cavalcante tentou suicídio e teve 85% do corpo queimado. A segunda filha, como Morganna conta, foi o seu momento de renascimento e veio para mudar sua vida. A cicatriz no peito a impossibilitou de amamentar, mas não atrapalhou a gestação, que foi tranquila e feliz. “Eu me encontrei novamente como mulher após o nascimento da minha filha. Foi muito planejada e querida”, conta.
Nem tudo são flores...
Também por causa de uma forte depressão, Camila Raphaela Silva tentou suicídio há pouco mais de um ano e teve 65% do corpo queimado, entre braços, mãos, pescoço, seios e barriga. Esperando o quarto filho, ela está com 28 semanas de gestação, mas desta vez sente muitas preocupações devido às queimaduras.
“A gestação está sendo bem complicada, ainda estou em processo de cicatrização, então sinto algumas dores, coça bastante nos lugares em que queimou. Tenho o histórico da depressão grave com tentativa de suicídio, tive trombose quando estava internada das queimaduras e isso é um risco na gravidez.”, diz Camila, que faz acompanhamento com o obstetra do alto risco, psiquiatra, psicólogo e fisioterapia para o tratamento das queimaduras.
Cuidados
Mulheres que apresentam queimaduras na região do abdome merecem atenção, como destaca o cirurgião plástico e chefe da Unidade de Queimados do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Ricardo de Lauro. A pele sofre um processo de expansão cutânea natural e fisiológico ao longo dos nove meses, com maior recrutamento de pele no último trimestre de gravidez.
“Não é comum vermos repercussões graves para a gravidez, vai depender da gravidade das queimaduras sofridas na região abdominal e da qualidade, extensão e elasticidade das suas cicatrizes. As queimaduras graves, com perdas de pele e tecido profundos do abdome, podem representar um desafio para o crescimento uterino, mas casos de abortos são relatos raros na literatura médica especializada”.
A gravidez de uma mulher que sofreu queimaduras não é muito diferente de uma que não passou pelo mesmo problema, atentando, apenas, para que os cuidados com a pele - hidratação e ganho de peso controlado - têm de ser intensificados, além de um pré-natal bem-feito, com consulta a um serviço de queimados, caso haja dúvidas.
Em queimaduras durante a gravidez, nos casos mais graves é recomendada a internação da gestante em serviço especializado, com acompanhamento conjunto com a obstetrícia.
“Como em queimaduras em geral, a mortalidade para a mãe e a criança vai depender da idade da mãe, da extensão da queimadura, da presença concomitante ou não de queimaduras de vias aéreas e de outros fatores, tais quais, situação de saúde da mulher, tempo existente entre o evento da queimadura e o acesso a um serviço de saúde preparado para o tratamento inicial, a existência de outras comorbidades por parte da mãe etc.”
Riscos
O cirurgião plástico Ricardo de Lauro faz um alerta para uma queimadura que está se tornando frequente nos centros de tratamento de queimaduras (CTQs) que são as sofridas por pacientes que, após o nascimento do bebê, desenvolvem mastite puerperal - processo infeccioso agudo das glândulas mamárias que acomete mulheres em fase de lactação, comum em 2 a 10% das lactantes.
“É comum que essas pacientes apliquem compressas quentes ou mesmo produtos variados sobre as mamas, já agredidas pelo processo inflamatório e infeccioso da mastite. Muitas vezes terminam queimando de maneira mais ou menos grave uma ou ambas as mamas, por vezes comprometendo até mesmo a capacidade de dar continuidade à amamentação”, ressalta.
O cirurgião conta, ainda, que tem presenciado casos de queimaduras, térmicas ou químicas, provocadas por substâncias presentes em receitas caseiras, combinadas com a mastite. “Chegam a ser tão graves que essas mulheres terminam por perder parte ou mesmo a totalidade dos tecidos mamários superficiais e profundos, com necessidade de cirurgias reparadoras de reconstrução mamária posteriormente”, alerta.