- 10/07/2020
SBQ inicia coluna para apresentar o trabalho desenvolvido nas regionais
Presidente da Sociedade Brasileira de Queimaduras regional Minas Gerais desde 2019, a fisioterapeuta Marilene Massoli trabalha com queimados há quase 30 anos.
Ela inaugura a nova coluna do site SBQ, chamada "Fala, presidente", que trará, quinzenalmente, uma entrevista com nossos representantes nas regionais Brasil a fora.
Marilene Massoli fala, com amor, sobre sua atuação desde que foi aprovada em concurso público no Hospital João XXIII e como tem atuado à frente da SBQ.
Como e quando começou a atuar na causa de queimados?
Aprovada em concurso público em 1987, fui chamada, em 1991, no Hospital João XXIII e levada diretamente ao andar de queimados. Nunca tinha visto um queimado. Saí de lá enlouquecida, direto para a livraria. Comprei o que tinha: Queimaduras, do Ary do Carmo Russo, e Reabilitação no Tratamento das Queimaduras, de Simon & Dossa. Uma preciosidade! Devorei! Mais tarde, consegui o Queimaduras - Pruitt, de quem me tornei tiete eternamente. Meu livro de cabeceira.
Conte-nos sobre sua trajetória nessa paixão.
Iniciei no que, na época, chamava-se Unidade de Queimados Graves, onde havia nove leitos. Mais tarde, lá foi transformado em Centro de Tratamento Intensivo - Unidade de Tratamento de Queimados (UTQ).
Sempre trabalhei com o grande queimado. Naquela época, os pacientes de enfermaria ainda ficavam junto com clínica médica e pediatria. Em 1994, foi inaugurada a UTQ, com 36 leitos. Eu permaneci no grande queimado. Agora, já com terapia intensiva. Evoluímos com revezamento de ambulatório pós-alta e alguns leitos de enfermaria.
Dessa forma, pude vivenciar, nesses anos de trabalho, todas as etapas da evolução da queimadura. Tive oportunidade de acompanhar inúmeros desbridamentos, enxertos, retalhos e intervir em sala cirúrgica, o que colaborou muito para minha compreensão dessa reabilitação.
Tive a benção de participar de uma equipe interprofissional de verdade e isso nos possibilitou grandes avanços. Passamos por dificuldades de serviços públicos, carências e trabalhamos muito com improviso e criatividade, tentando minimizar as consequências físicas ao nosso paciente.
Na balança muito mais alegria pelas vidas que ajudei a salvar, pela fé na vida que ajudei a devolver, pelas funções que trabalhamos juntos para recuperar, pelos sorrisos e abraços que pude ajudar a devolver. É uma grande emoção reabilitar um queimado. É ser fisioterapeuta na sua mais pura essência!
Além de presidir a SBQ Minas Gerais, onde atua?
Eu já me aposentei do serviço público. Mantenho atividade privada, ministro cursos livres e dou consultoria.
Quais são os maiores desafios no tratamento a queimados em Minas Gerais?
Minas Gerais tem uma população de 20,89 milhões de habitantes e 853 municípios.
Belo Horizonte tem uma unidade com nove leitos de CTI e 24 de enfermaria exclusiva. No Hospital Universitário de Uberlândia, há outro centro de alta complexidade, porém com apenas oito leitos. A Santa Casa de Montes Claros é referência regional para o atendimento de queimados, mas sem centro especializado.
Juiz de Fora, que antes contava com três hospitais no atendimento a queimados, já não atende mais. Um grande déficit no estado e sem reposição.
É urgente mais centros de alta complexidade com 10 a 15 leitos entre CTI e enfermaria pelo estado. Minas é dividida em 10 macrorregiões, se cada uma tivesse uma unidade para atendimento de queimados, com equipe treinada, certamente reduziríamos o número de óbitos e a grande morbidade desses pacientes.
É hora do estado reconhecer que o ônus da prevenção e do tratamento de qualidade é infinitamente mais barato que internação prolongada, inúmeras cirurgias corretivas, anos de tratamento de sequelas e aposentadorias por incapacidade funcional.
Uma dissertação de mestrado de Marcelo Torres de Souza, do programa de saúde coletiva da Universidade Federal de Juiz de Fora, no ano de 2017, sob o título Análise dos fluxos de pacientes médios e grandes queimados na rede de assistência hospitalar do Sistema Único de Saúde de Minas Gerais mostra bem o fluxo, a concentração, número de casos por região e óbitos em Minas Gerais. Vale a pena a leitura.
Como a SBQ tem atuado na região?
Procuramos colaborar e apoiar e ser um braço da nacional na região. Em 2019, realizamos a XI Jornada Brasileira de Queimaduras . Um sucesso de público e de conteúdo científico. O retorno dos participantes foi bastante gratificante.
No mesmo ano ocorreu o acidente de barco no Acre e colaboramos com a SBQ nacional na busca de vagas nos centros especializados. Ficamos “ligados” quase 48 horas, viabilizando essas transferências. Ao contatar o então diretor do Hospital João XXIII só tínhamos duas vagas. O plano de catástrofes foi acionado e pudemos, dessa forma, receber os seis pacientes mais graves, que demandavam terapia intensiva.
Em 2020 a pandemia nos restringiu bastante, mas conseguimos divulgar bastante a Campanha Nacional de Prevenção! Um exemplo foi que conseguimos iluminar a Assembleia Legislativa de laranja.
A abertura da escolas tem nos preocupado bastante. Participei da plenária do Conselho Estadual de Educação e levei a eles nossa preocupação acerca do uso indiscriminado do álcool líquido e gel. Falei da importância de se orientar a prioridade da lavagem das mãos. Juntamos a isso uma carta aberta dessa Regional, da Sociedade Brasileira de Dermatologia - Regional Minas e uma nota técnica da Anvisa sobre intoxicação pelo álcool gel em crianças.